sábado, 21 de março de 2009

Dia mundial da poesia


AS AÇUCENAS

As açucenas rebentam primeiro que a flor macia
E trazem consigo manhãs mais puras de Setembro;
Amadurecem com os frutos indeléveis e frágeis,
De suculentos brilhos nocturnos.

São feitas, as açucenas, de ar e perfumes
Lançados em barlavento de Outubro;
Pedem mais, e que mais!, ossos de passarinho,
Que musicam para nós um ouvido fértil.

De memórias e sombras, oculta esta a razão,
Este o saber e a técnica dos papagaios tristes
E cabisbaixos de nada. São aves raras na pequenez do seu pensar,
Mas revestem em si mesmas a pele – esta vontade de voar!

A liberdade é assim. E todos nós assim seremos:
Nascerá uma pessoa nova logo que as açucenas o anunciem.
Para isso, basta... Bastará, com certeza, a concertina ou a viola do cavador,
Que amanha a terra nas tardes quentes do Verão!

Não queiras, andorinha, saber qual tua a liberdade;
Não interrogues em ti mesmo a incerteza das vinhas.
O pão é certo. O verbo existe,
E, no fundo, lá bem no fundo, as palavras já te dizem tudo.

José Carlos Pereira
in "Sem Síntese de Mim"